por Breno Lucano
Como Holbach leria Bolsonaro? De que modo articular o pensamento do filósofo iluminista com o Brasil atual?
Antes de mais nada devemos pensar sobre a constituição daquilo que Holbach chama natureza e sua característica mais notável: o determinismo. Ora, será o homem verdadeiramente livre, uma vez inserido num mundo com leis naturais inescapáveis? Noutras palavras, podemos pensar em livre arbítrio e liberdade de escolha num sistema que seja inteiramente voltado para o determinismo? Essa questão permeia a filosofia desde Epicuro e atinge o Iluminismo com Holbach.
Estamos demasiadamente a pensar em termos cristãos quanto a isso. Imaginamos num ser divino que, miraculosamente, conduzirá a um grau de liberdade à medida em que se assenta em determinadas noções metafísicas. O Reino está aberto para libertar o homem das amarras do mundo repleto de pecado e maldade. Mas em Holbach não temos um destino nesse sentido; também não se trata de um logos de Zenão de Cício, embora o mundo leis que comandam seu movimentos e da própria matéria.
Holbach não perde de vista que o homem é determinado por sua constituição interna e externa; que as percepções dependem da qualidade dos sentidos ou dos órgãos; e, finalmente, que os movimentos e apetites são influenciados pela própria constituição humana, tanto do ponto de vista natural quanto cultural. Essas prerrogativas antropológicas equivalem a dizer que o homem não é um sujeito à parte da natureza, mas dele faz parte. E mais, que sua excelência não está no controle de de seus instintos e tendências naturais.
É lugar-comum afirmações como a de que um ateu é um propulsor da desordem e da imoralidade. Mas Holbach vai por outro caminho, esclarecendo o homem sobre sua própria natureza para que se possa buscar viver dignamente. O barão busca o homem virtuoso, para que esse homem produza boas leis e para que boas leis produzam bons homens.
Para Holbach uma vida em que se pensa o aqui e agora e despreocupado com as noções metafísicas não encontra espaço no niilismo. O autor luta por uma vida mais sensata e racional, que possibilite o desenvolvimento de suas potências e virtudes.
Claro, assim como os religiosos, Holbach reconhece que os excessos são prejudiciais tanto à vida dos indivíduos quanto à coletividade. As paixões apenas conduzem a devaneios quando não se vive a própria natureza de um modo são e verdadeiro. O barão afirma que as paixões não são boas nem más, apenas necessárias à nossa constituição, sendo sua principal função nos estimular a buscar o que nos fortalece e, por consequência, repelir o que nos prejudica e mata. E prossegue afirmando que, como a razão é constituída por falsas idéias, as paixões serão sempre um risco real a se pensar. O discurso holbaquiano não ataca as paixões em si, mas pretende defender o perfeito entendimento de suas funcionalidades e colocá-las à serviço da vida humana.
Na infância se formam as noções que carregamos por toda a vida. E é justamente numa educação falha que leva às crianças a tais noções. A pedagogia é o caminho que se faz necessário para aprender desde cedo amais fundamental de todas as verdades: que fazemos parte da natureza e que, por isso, tais como todos os seres, também estamos submetidos às suas leis.
Tendo sua atenção para o agora, Holbach compreende que os poderes instituídos sabem que manter os homens na ignorância é a melhor forma de contê-los para dominá-los. Trata-se de uma ignorância estimulada e cultivada ativamente por uma máquina que alimente e se alimenta de nossos medos, de nossa covardia diante da vida e, sobretudo diante da morte.
Num discurso que aparecerá ainda em Feuerbach e Marx, Holbach nos convida a pensar sobre a precariedade das escolas e das noções comuns que rodeiam a sociedade como mecanismo que busca demonstrar a instrumentalização do controle social por meio do medo.
A inter-relação entre forças necessárias conduziram o Brasil ao que temos atualmente. A regência de um presidente inepto como Bolsonaro, cristalizado nos anos 60 e em Golbery, associado às idéias opacas da classe média de anticorrupção conduziram o país a uma nação repudiada pelo panorama internacional.
A ordem do mundo viu a eleição de Bolsonaro como necessária, mas cabe ao homem - também por necessidade - mudar a sociedade. Para Holbach, o determinismo não significa que as coisas devam ser como são. Como foi dito, a escola tem muito a fazer. Crianças educadas produzirão uma boa sociedade e, assim, uma nação virtuosa, apesar de Deus.
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