Sobre a Privatização do SUS


por Breno Lucano

Recentemente o Presidente da República assinou um decreto que autoriza estudos para uma parceria privada com Unidades Básicas de Saúde (UBS), tendo como foco a atração de investidores para atuar em duas mil unidades inacabadas. Segundo o governo, o SUS continuará sendo gratuito, não tendo intenção de alterar sua estruturação. 

Após manifestações públicas contrárias, Bolsonaro voltou atrás e revogou o decreto que abria as portas para a privatização do SUS. Bolsonaro diz que fora mal-entendido, a questão era apenas fazer com que a população pudesse ser bem-atendida, como ele é bem atendido na rede privada. Não se trata de privatização, mas uma compra de vagas na rede privada. Temos, portanto, uma velha prática do empresariado que tenta reduzir sua taxa tributária afim de ampliar seus lucros. 
Bolsonaro afirma que pode reeditar a medida em havendo entendimento futuro dos benefícios propostos. Ou seja, ele não desistiu do projeto. Entendimento de quem?  Da população? Sim, em parte. Devemos recordar como ocorreu com a reforma da previdência. As críticas e a aclamação pública não foram generalizadas. Então, o Congresso ficou predisposto a negociar a reforma. 
Temos mudança de tática, mas não de objetivos. Ao invés de decreto presidencial, lança-se mão do legislativo, repleto de congressistas que representam o setor privado. Joga-se a proposta da privatização para o legislativo, que a aprova. 
Como o senso comum, Bolsonaro está convencido de que o que é público possui qualidade inferior. O privado, por outro lado, possui qualidade superior. Mas não recorda de que toda sua carreira veio em decorrência do público. Primeiro enquanto miliar, depois enquanto deputado e, agora, presidente. Ou seja, sua vida é vinculada ao público. 
Foi eleito com pauta radical de direita e que deve responder aos planos de privatização e ao mercado financeiro. E, se o mercado financeiro tem algum interesse, é necessário aprovar. Aliás, faz-se necessário ainda mais apoio desse mercado e do neoliberalismo para futura reeleição. 
Então, Bolsonaro vai tentar privatizar o SUS pelo mesmo caminho da reforma da previdência: sem decreto, com projeto para o legislativo. Ou, ainda, de outro modo, fazendo com que sua ala de apoio no congresso crie um projeto igual ao do Guedes e envia para discussão no plenário. Assim, o projeto não sai do Executivo, mas diretamente do Legislativo. Não há risco de embargo pelo Congresso. A oposição não consegue barrar e a população começa a pensar que a melhor coisa que pode acontecer é a privatização do decadente SUS. 
O projeto consiste em abrir a possibilidade de comprar vagas da Unidade Básica de Saúde (UBS). E também de se construir UBS pela iniciativa privada. Não é exatamente isso que dá lucro, mas o perdão de dívidas no fisco, como o PROUNI. Quem vende vaga é beneficiado no imposto de renda. Mas isso também serve para que se crie uma empresa e se beneficie do número de pessoas que usam o SUS. Quanto maior o número de pessoas atendidas, maior sua penetrabilidade no mercado de ações. Então, temos uma empresa que atende muita gente e, por isso, vende muitas ações. Portanto, duplo benefício: o subsídio do público que ajuda o privado; e a formação, a partir do público, de ações que se vendem no mercado financeiro.
O projeto ainda está vivo e, a qualquer momento, pode tornar-se real. Então, o que fazer? Precisamos ficar atentos para seu retorno e para a dispersão da ideia, a partir da base dos deputados, de que o SUS não atende as expectativas e que todo o funcionalismo público precisa ser reduzido. Mas, principalmente, tendo a consciência de que o projeto de retirada de verba do SUS vai continuar, para afirmar depois que ele não funciona. E, o que é pior, essa retirada de verba não necessita de decreto e, por isso, não pode ser derrubado pelo Congresso. Trata-se apenas de administração pública. Uma vez a rede frágil, a sociedade endossa o ideário neoliberal de redução do Estado e ampliação da iniciativa privada. Ou seja, tem-se cada vez mais a ideia de que cada UBS sirva como uma pequena unidade do Sírio Libanês. 





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