Bolsonaro e a Vacina


Por Breno Lucano

Recentemente o Presidente da República Jair Bolsonaro afirmou na Jovem Pan que a vacina Coronavac, desenvolvida pelo laboratório chinês Sinovac Biotech contra Covid-19 e testada pelo Instituto Butantan, não será adquirida pelo Governo Federal, mesmo se for autorizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Bolsonaro alega que existe um “descrédito muito grande” em relação ao laboratório e sugeriu que não aceitará ser vacinado. 

Bolsonaro pôs em dúvida a credibilidade da vacina e afirma que outras vacinas estão em estudo e que poderão ser comprovadas, mesmo que no decorrer de anos.  A determinação do Presidente veio menos de 24 horas após o Ministério da Saúde anunciar a intenção em adquirir 46 milhões de doses da Coronavac, desautorizando o ministro Eduardo Pazuello. Bolsonaro critica o ministro afirmando que se precipitou ao assinar o protocolo de intenção de compra da vacina e que deveria ter sido avisado antes da decisão. Ao falar sobre a necessidade da aprovação da ANVISA para que uma das vacinas seja distribuída no país, Bolsonaro defende que não se pode “brincar” com vidas humanas, “e muito menos querer fazer política”. Esse muito menos querer fazer política, entretanto, possui aspirações políticas, populistas e democráticas.
Em outro momento, Bolsonaro já afirmara que não obrigaria a população a se vacinar e se mostrou indiferente entre comprar ou não comprar a vacina. A notícia da compra da vacina pelo Ministério fez com que sua base eleitoral reagisse. Afinal, essa vacina viria de uma origem comunista e para seus apoiadores a China ainda é comunista. Atendendo às exigências de suas bases, ele determina o cancelamento da compra. Bolsonaro diz que a vacina precisa ter comprovação científica. Mas só a vacina, não a hidrocloroquina e Ivermectina! Esses podem ser usados sem validação científica. 
Esta política combina com o libertarismo embutido no neoliberalismo do Guedes e que o Bolsonaro aprova e até aprofunda sendo ainda mais libertário e se confundindo com o anarcocapitalismo. O Estado se transforma numa poeira. Assim, a própria sociedade perde sua organização, a não ser que se tratasse de uma organização anarquista, com a instrumentalização de cooperativas. Mas isso denotaria uma outra organização. Bolsonaro não quer isso. Ele deseja apenas a lei do mais forte com o aval do capital financeiro. Isso é um governo neoliberal encontrando um governo populista para se realizar.
Mais que uma proposta econômica, o neoliberalismo se apresenta como uma forma de agir no Estado. Liberdade total para todos! Alguma regulação está atrapalhando, vamos acabar com ela. Fez mais pontos na carteira de motorista do que deveria? Vamos aumentar a pontuação. Está pescando em área de proteção ambiental e foi multado? Agora você poderá pescar o quanto quiser, em qualquer época do ano.
O embate entre os que defende ou não o Estado mínimo não é novo. Na República Velha o embate era entre positivistas e liberais. Medidas hoje entendidas como triviais eram discutidas na época, onde liberais defendiam que a escola não deveria ser obrigatória. O mesmo ocorreu com a revolta da vacina, quando defendiam a liberdade total do indivíduo a ponto de colocar a saúde pública em risco pela opção deliberada de não se vacinar.
Por outro lado, a vacina está em confronto num quadro de biopoder e biopolítica, isto é, o impacto do poder na vida biológica e a política que se manifesta na organização da vida biológica. A Covid-19 nasceu na sociedade, se desenvolveu na sociedade e exerceu também uma política geográfica. Ela separa as pessoas geograficamente por poder aquisitivo e diz que os pobres vão morrer, dado que não pode fazer isolamento social. O mesmo não acontece com os ricos, que se isolam e vivem do capitalismo financeiro. Basta verificar nos meios de comunicação como certos setores da indústria alcançaram altas taxas de lucro na pandemia. O vírus faz triagem entre fortes e fracos e Bolsonaro incentiva como coadjuvante nesse processo. Por exemplo, ele não queria dar o auxílio emergencial e depois falou em apenas R$ 200,00. Tudo isso foi decisão política. 
A compra da vacina, simbolicamente, também pode representar um trabalho contra o próprio Bolsonaro, já que atrapalha seu darwinismo social. Os pobres devem morrer porque são fracos. Com a vacina isso acaba e todos sobrevivem, pobres e ricos. 
Não comprar a vacina representa um elemento político capaz de fazer com que a política de Bolsonaro de eugenia seja interrompida. A prioridade é não comprar a vacina porque, assim, os problemas sociais seriam resolvidos. Isso é acreditar na imunidade de rebanho. Isso é acreditar que apenas os de porte atlético sobrevivem e, se adoecerem, basta tomar cloroquina. Uma secretária do Ministro da Economia de seu governo, Paulo Guedes, também pensa assim, já que revelou publicamente que se morresse pobre e velho seria melhor para o projeto da Previdência. 
Como sugestão de solução temos prioritariamente a ampliação do papel do Estado no processo e desenvolvimento da pandemia no país. A vacinação não é questão de liberdade individual, mas de saúde pública e, enquanto saúde pública, uma preocupação com a coletividade. Isto é, a prioridade da coletividade recai sobre a liberdade individual. 
O negacionismo deve ser combatido. Porte atlético pode se contaminar tanto quanto aqueles que não praticam atividade física. E entender o papel da ciência na construção de medidas eficazes tanto na prevenção quanto no tratamento da doença, validando as medicações corretas e profilaxias apropriadas. 
O Ministro da Saúde deve ter autonomia em suas ações e agir de forma independente enquanto diferencial para o controle de qualquer doença. O parecer técnico deve estar na frente dos interesses políticos.  
Finalmente, devemos considerar a pressão popular na construção de processos que combatam a doença, favorecendo e pressionando o Estado no sentido da adoção de medidas que prestigiem a sociedade. Não mais um Estado mínimo, mas um Estado que, ancorado às pressões populares, se desdobre em políticas públicas de qualidade para todos. 











































Nenhum comentário :

Postar um comentário

Caro leitor do Portal Veritas, ao escrever uma consideração, algumas medidas devem ser observadas.

Considerações sobre uma publicação APENAS devem ser tecidas na publicação relativa. Toda e qualquer consideração sem relação não será aceita pela gerência.

Caso haja necessidade de escrever algo sem nenhuma relação específica com qualquer publicação, utilize o LIVRO DE VISITAS, anunciado no menu do portal. Nele serão aceitas sugestões, comentários, críticas, considerações diversas sobre vários temas.

Em necessidade de contato com a gerência de modo privado, sugerimos o FALE CONOSCO, também no menu. Todas as mensagens são devidamente respondidas.

Agradecemos pela colaboração!


Breno Lucano
Gerente do Portal Veritas