Michel Onfray é um dos filósofos contemporâneos mais polêmicos e influentes da atualidade. Seu livro Política do Rebelde: Tratado de Resistência e Insurreição (1997) apresenta uma crítica contundente ao Estado, às instituições de poder e às formas de dominação impostas pela sociedade moderna. Nesta obra, Onfray constrói um verdadeiro manifesto libertário, defendendo uma filosofia de resistência ativa contra as estruturas de poder que moldam a sociedade ocidental. Sua abordagem se insere dentro de uma tradição filosófica que remonta a autores como Nietzsche, Stirner e Proudhon, os quais compartilhavam uma visão cética em relação ao papel do Estado e das instituições. A proposta de Onfray, no entanto, difere por sua ênfase na aplicação prática da rebeldia e no hedonismo como instrumento de emancipação.
O autor se define como um anarquista hedonista, rejeitando qualquer forma de opressão estatal ou ideológica. Para ele, a política deve ser um espaço de experimentação da liberdade, e não um instrumento de controle. Em Política do Rebelde, ele propõe um modelo de resistência baseado no prazer, na liberdade individual e na autodeterminação. Essa ideia se contrapõe às formas tradicionais de engajamento político, que muitas vezes acabam por reproduzir novas estruturas de poder. Onfray acredita que a submissão ao Estado é uma forma de escravidão moderna e que a emancipação deve partir da ação direta e do pensamento crítico. Como ele afirma: “a submissão ao Estado é uma forma de escravidão moderna” (Onfray, 1997, p. 45). Seu pensamento encontra eco em diversas correntes libertárias, desde o individualismo radical até formas de resistência comunitária.
Ao longo da obra, Onfray desenvolve uma crítica implacável ao Estado como mecanismo de controle e opressão. Ele denuncia a maneira como o poder se perpetua através de mecanismos sutis, muitas vezes camuflados sob o discurso democrático. Segundo ele, o Leviatã moderno se impõe como um deus absoluto, exigindo obediência cega da população. Para Onfray, as democracias ocidentais apenas mascaram formas sutis de totalitarismo, onde a liberdade individual é cerceada por leis, impostos e burocracia. Essa constatação ressoa com a crítica de outros teóricos anarquistas, que veem o Estado não como um protetor da liberdade, mas como seu principal adversário. No pensamento onfrayano, o verdadeiro ato revolucionário não passa pela tomada do poder, mas sim por sua dissolução.
Diferente de uma visão meramente teórica, Onfray propõe que a rebelião deve ser vivida na prática. Ele resgata a tradição de pensadores como Nietzsche, Stirner e Proudhon, enfatizando que a insurreição não deve ser apenas contra o Estado, mas também contra os dogmas culturais e morais impostos pela sociedade. Como ele mesmo diz: “A verdadeira revolução começa na mente e se reflete nas atitudes cotidianas” (Onfray, 1997, p. 134). Esse aspecto subjetivo da revolução remete à ideia de que toda transformação social genuína deve ter como ponto de partida a mudança individual. Para Onfray, resistir ao poder significa recusar os valores impostos pela sociedade e construir, a partir de si mesmo, um modo de vida autêntico e libertário.
A influência nietzschiana é evidente em toda a obra. Onfray resgata a ideia de vontade de poder, defendendo que o indivíduo deve construir sua própria moral, livre das imposições religiosas e políticas. Ele argumenta que “a autonomia real só é possível quando nos libertamos das amarras ideológicas” (Onfray, 1997, p. 175). Essa perspectiva leva a uma crítica radical às ideologias universalistas, que pretendem impor valores absolutos a todos os indivíduos. Onfray rejeita tanto o dogmatismo religioso quanto as promessas de redenção coletiva oferecidas por projetos políticos totalitários. Para ele, cada indivíduo deve encontrar seu próprio caminho, sem se submeter a sistemas de pensamento que negam sua singularidade.
O anarquismo de Onfray se diferencia dos modelos tradicionais, pois enfatiza o prazer e a individualidade. Ele rejeita tanto o comunismo quanto o neoliberalismo, argumentando que ambos impõem estruturas que limitam a liberdade. Para ele, “o verdadeiro rebelde não busca substituir um poder por outro, mas sim abolir todas as formas de dominação” (Onfray, 1997, p. 210). Essa visão se opõe à ideia de que a revolução consiste apenas em substituir uma classe dominante por outra. Em vez disso, Onfray propõe uma dissolução completa das hierarquias e um modelo de organização baseado na autonomia individual e na cooperação voluntária.
Outro ponto importante do livro é a crítica à cultura de massa e à alienação promovida pelos meios de comunicação. Onfray defende que “a televisão e a publicidade criam um mundo artificial onde a rebelião é domesticada” (Onfray, 1997, p. 243). Ele vê na indústria cultural um dos principais instrumentos de dominação, pois ela molda subjetividades e reforça valores que servem aos interesses do poder. Para ele, a cultura deve ser um espaço de questionamento e emancipação, e não de conformismo. A crítica à cultura de massa leva Onfray a enfatizar a importância da educação filosófica e do pensamento crítico como ferramentas para a libertação individual.
O conceito de hedonismo, presente em toda a obra de Onfray, aparece em Política do Rebelde como uma forma de resistência. O autor propõe uma ética do prazer consciente, onde o indivíduo deve buscar a felicidade sem se submeter a normas externas. “Ser livre é viver de acordo com os próprios valores, sem medo das repressões sociais” (Onfray, 1997, p. 290). Essa proposta resgata uma tradição filosófica que remonta aos antigos cirenaicos e epicuristas, que viam no prazer um elemento essencial para a vida boa.
Política do Rebelde é um manifesto contra todas as formas de opressão, chamando o leitor à ação concreta. Onfray nos lembra que “não basta pensar a liberdade; é preciso vivê-la” (Onfray, 1997, p. 315). Sua filosofia é um convite para que cada indivíduo construa sua própria trajetória, desafiando as estruturas de poder que limitam a autonomia pessoal. Com esse livro, Michel Onfray se consolida como uma das vozes mais radicais do pensamento libertário contemporâneo, inspirando gerações a questionar, resistir e se rebelar contra os mecanismos de dominação que estruturam a sociedade moderna. Seu legado continua a ecoar entre aqueles que não aceitam a servidão voluntária e buscam, em cada ato cotidiano, a afirmação de sua liberdade.
Nenhum comentário :
Postar um comentário
Caro leitor do Portal Veritas, ao escrever uma consideração, algumas medidas devem ser observadas.
Considerações sobre uma publicação APENAS devem ser tecidas na publicação relativa. Toda e qualquer consideração sem relação não será aceita pela gerência.
Caso haja necessidade de escrever algo sem nenhuma relação específica com qualquer publicação, utilize o LIVRO DE VISITAS, anunciado no menu do portal. Nele serão aceitas sugestões, comentários, críticas, considerações diversas sobre vários temas.
Em necessidade de contato com a gerência de modo privado, sugerimos o FALE CONOSCO, também no menu. Todas as mensagens são devidamente respondidas.
Agradecemos pela colaboração!
Breno Lucano
Gerente do Portal Veritas