A julgar pelos testemunhos que nos chegaram, não parece que Panécio se tenha ocupado de problemas lógicos, nem que tenha sistematicamente repensado todos os problemas da física. Neste âmbito, todavia, ele trouxe algumas correções aos dogmas da escola, que são de certa importância.
Provavelmente, para fugir às críticas céticas, Panécio abandonou o dogma da conflagração universal e acolheu a idéia peripatética da eternidade do mundo. 1 Naturalmente isso devia comportar, como consequência, o redimensionamento de alguns principais conceitos físicos. O mundo não podia mais ser entendido como um grande ser vivente que nasce, desenvolve-se e depois morre; portanto, a fundamental concepção vitalista do antigo Pórtico devia mudar de significado. E, negada a ekpyrosis, mudava também a função de Deus como fogo artífice, pois ele cessava de dissolver em si e, depois, regenerar por si, as coisas periodicamente: portanto, a função de Deus acabava por se tornar a de regente, mais que a de artífice do cosmo. 2 Mas dificilmente Panécio deu-se conta dessas implicações da negação da ekpyrosis, tanto mais que ele assumiu nesse ponto uma atitude nuançada, às vezes negando a ekpyrosis, às vezes, ao contrário, limitando-se a levantar dúvidas sobre ela. 3
Também diante da adivinhação, tão cara ao antigo Pórtico, Panécio assumiu uma atitude crítica, que os testemunhos às vezes dizem ser de nítida recusa 4, às vezes de cautelosa dúvida. 5 Também essa tomada de posição devia ter repercussões não leves sobre os princípios; em particular, ela comportava, se não a negação, pelo menos um notável enfraquecimento da convicção do antigo Pórtico de que todo evento é estruturalmente ligado a todos os outros, de modo que cada um tem repercussões sobre todos os outros e vice-versa. 6
Enfim, nessa mesma ordem de pensamento situa-se também a clara negação de Panécio da astrologia 7, que devia, analogicamente, redimensionar o conceito estóico de Destino.
Notas:
1. Cf. van Straaten, frs. 64-69
2. Cf., a propósito disso, as interessantes observações de B. N. Tatakis, Panétius de Rhodes, le fondateur du moyen stoicisme, sa vie et son oeuvre, Paris 1931, pp. 102-110.
3. Cf. van Straaten, frs. 64 e 69
4. Cf. van Straaten, frs. 68 e 73
5. Cf. van Straaten, frs. 70 e 71
6. Cf. Tatakis, Panétius..., p. 110ss.
7. Cf. van Straaten, fr. 74
REALE, Giovanni. História da Filosofia Antiga. Vol. III. São Paulo: Loyola, 1994. p. 367-368
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As Meditações de Marcus Aurelius
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Natureza e Política no Estoicismo Romano
Provavelmente, para fugir às críticas céticas, Panécio abandonou o dogma da conflagração universal e acolheu a idéia peripatética da eternidade do mundo. 1 Naturalmente isso devia comportar, como consequência, o redimensionamento de alguns principais conceitos físicos. O mundo não podia mais ser entendido como um grande ser vivente que nasce, desenvolve-se e depois morre; portanto, a fundamental concepção vitalista do antigo Pórtico devia mudar de significado. E, negada a ekpyrosis, mudava também a função de Deus como fogo artífice, pois ele cessava de dissolver em si e, depois, regenerar por si, as coisas periodicamente: portanto, a função de Deus acabava por se tornar a de regente, mais que a de artífice do cosmo. 2 Mas dificilmente Panécio deu-se conta dessas implicações da negação da ekpyrosis, tanto mais que ele assumiu nesse ponto uma atitude nuançada, às vezes negando a ekpyrosis, às vezes, ao contrário, limitando-se a levantar dúvidas sobre ela. 3
Também diante da adivinhação, tão cara ao antigo Pórtico, Panécio assumiu uma atitude crítica, que os testemunhos às vezes dizem ser de nítida recusa 4, às vezes de cautelosa dúvida. 5 Também essa tomada de posição devia ter repercussões não leves sobre os princípios; em particular, ela comportava, se não a negação, pelo menos um notável enfraquecimento da convicção do antigo Pórtico de que todo evento é estruturalmente ligado a todos os outros, de modo que cada um tem repercussões sobre todos os outros e vice-versa. 6
Enfim, nessa mesma ordem de pensamento situa-se também a clara negação de Panécio da astrologia 7, que devia, analogicamente, redimensionar o conceito estóico de Destino.
Notas:
1. Cf. van Straaten, frs. 64-69
2. Cf., a propósito disso, as interessantes observações de B. N. Tatakis, Panétius de Rhodes, le fondateur du moyen stoicisme, sa vie et son oeuvre, Paris 1931, pp. 102-110.
3. Cf. van Straaten, frs. 64 e 69
4. Cf. van Straaten, frs. 68 e 73
5. Cf. van Straaten, frs. 70 e 71
6. Cf. Tatakis, Panétius..., p. 110ss.
7. Cf. van Straaten, fr. 74
REALE, Giovanni. História da Filosofia Antiga. Vol. III. São Paulo: Loyola, 1994. p. 367-368
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