É lugar comum que o Brasil é um país democrático, direito assegurado pela Constituição de 88. Nesse regime de governo, há liberdade plena e nivelamento de igualdade entre todos os seus cidadãos. Não existem segmentos sociais que se sobrepõem, à força, sobre outros segmentos, impondo-lhes ideologias próprias. Pelo menos teoricamente...
Nos últimos meses, temos visto mais um deplorável exemplo de perversão desse regime. Com todas as forças, a ditadura gay - como os conservadores gostam de mencionar o movimento LGBT - ressurge como uma estrutura social que pretende conquistar direitos civis historicamente negados. A luta é árdua. Inesperadamente, em maio, o Supremo, guardião da Constituição, entende a união estável como direito legítimo de qualquer cidadão gay - importante passo em direção à democracia. Imediatamente, deputados evangélicos que desejam tornar o Brasil novamente um país clerical se organizam para formar a Frente Parlamentar em Defesa da Família, defendendo a família, a moral e os bons costumes, em nome de um tal crucificado. Conseguiram chantagear - sempre pensei que chantagem fosse pecado! - a presidência da república a vetar o material pedagóico que serveria como apoio a docentes no combate e prevenção do bullying nas escolas públicas. E foi anunciado na última semana que um deputado pastor - que certamente entende mais de bíblia que de democracia - requereu um plebiscito nas próximas eleições para que o povo decida sobre a legalidade do casamento. Nada mal para um pastor que afirma que a etnia negra foi formada por uma maldição de deus - sempre pensei que o crucificado falasse de inclusão.
Num mundo antropologicamente em perpétuo devir, onde a cultura é continuamente alterada por novos valores e perspectivas, certo partido político insiste em afirmar sua luta por um Brasil fundamentalista e patriarcal, liderado por chefes tribais que controlam todos os atos e pensamentos de seus seguiores, não abrindo qualquer possibilidade à subjetividade, à liberdade e à democracia: claro retorno a um Afeganistão talibã. Nietzsche e Marx teriam muito a dizer sobre o péfido slogan homem + mulher + amor = família.
O pastor Ricardo Gondim tem razão ao prever os flagelos de um Brasil evangélico. A repressão seria o imperativo máximo da cultura, com o total desaparecimento de poetas, músicos, cantores e cientistas que não mencionassem a fórmula em nome do Senhor Jesus. Veríamos a criação de uma guerra santa contra demônios imaginários. Os comunistas têm razão, a religião é o ópio do povo!
Enquanto a democracia não é banida, aguardemos as próximas investidas de um parlamento que possui o demônio como figura central de sua teodicéia.
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Chega a ser algo assustador esse possível retorno da religião nos meios políticos! Parece que a bancada religiosa - sobretudo a que se autointitula evangélica - sugere um retorno à Idade Média ou à Inquisição quando propagam aos 4 cantos que o país - ou o mundo - está nas mãos do demônio!
ResponderExcluirVicente, numa entrevista que Onfray deu certa vez, é afirmado que a religião sempre estará presente porque o homem teme o futuro. Em termos de Brasil, temos também a pobreza da religião que, à todo custo, pretende encontrar uma resposta mágica, sobrenatural, às suas desgraças, assim como construir alguma esperança em dias melhores. Temos uma combinação perigosa: o medo e a pobreza.
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